Escrever sempre me foi uma tarefa corriqueira. Na verdade, algo tão habitual que muitas vezes nem me dava conta disso. Antes mesmo de ser alfabetizada, eu já criava as minhas verdades inventadas. Poemas recitados, em voz alta, no balanço do playground, no banho, antes de dormir. Hábito estranho que sem dúvida contribuiu na decisão de minha mãe de que um psicólogo infantil talvez fosse uma boa ideia.
E eu sempre gostei dos livros. Eu recontava as histórias que a minha avó lia, mas sempre tornando-as mais apetitosas para os meus instintos de maldição precoce. O príncipe que caiu no sono para sempre junto à amada. Os porquinhos que deram uma indigestão sem fim ao lobo. A princesa que, como um santa do catecismo, ficou para sempre, belíssima, em seu esquife de vidro. Mal sabia eu que, na verdade, aquelas histórias tinham finais muito mais mórbidos do que aqueles que eu improvisava. Talvez seja por isso que, até hoje, elas me fascinem tanto.
Pouco tempo depois, os hormônios e os anos de som e fúria chegaram com todas as suas interpéries, trazendo consigo vozes que mudaram tudo. O negror, a dor, a peste, a violência, a luxúria, a sede de viver algo que ainda não tem nome e que jamais o terá. Os gritos de outros tempos que chegavam até mim em meu quarto gelado no alto das montanhas como se fossem meus espelhos. Após desses dias, nunca mais me senti só. E descobri que eu também podia berrar.
Donatien, Oscar, Edgar, Arthur, Augusto, Mary, Manuel, George, Percy, Viriginia, Caio, Sylvia, Ana. Os meus poetas que me acompanham vida afora, que souberam tão bem flertar com a morte e serem por ela consumidos. Os meus moços da Escola de Morrer Cedo, que não tiveram medo da tormenta que se esconde por trás dos combustíveis para a alma. Sejam eles amores improváveis, impossíveis, proibidos. O torrão de açúcar que transforma o absinto. As sementes de papoula. A solidão intransponível do que apodreceu. Eles, que não tinham medo das chamas.
Os meus poetas já estavam mortos quando o sol se levantava para mim e me orgulho de carregar suas mortes e suas odes ao que se foi, como um legado. Senti seus dedos pontudos me empurrando para o abismo, onde encontrei o meu caminho. E agora, tantos anos depois, devo a eles tudo o que persegui, conquistei e acalento para mim. A eles, dedico todo o meu amor mais incendiário e o meu desejo profundo de um dia, quem sabe, também poder compartilhar de toda essa maldição.
quinta-feira, 19 de julho de 2012
segunda-feira, 30 de abril de 2012
Tribulações
A vida anda atribulada. Tanto em termos de compromissos a ticar na agenda quanto em aflições. É um frio na barriga eterno, uma correria constante contra o relógio. Sempre tive uma grande tendência a maldizer os contratempos e fazer malabarismos para driblar os tormentos. Acostumei-me a sentir uma extrema tristeza que se aninhava como um gato em meu pâncreas em períodos assim. Mas não dessa vez. Tento respirar fundo o dia inteiro. Conto até dez. Ás vezes eu explodo entre o dois e o três, mas em geral funciona. Aproveito o tempo perdido em engarrafamentos e em belos dias de tempestade como o de hoje para ler livros teóricos (não, nada de poesia para mim ultimamente. Não me faria bem.), estudar matemática (sim, matemática. A certeza e a simplicidade dos números nunca me fascinou tanto.) e gramática (a mais lógica de todas as artes das letras). Eu já sabia que na maior parte dos casos, não pensar é uma dádiva, mas nunca consegui seguir essa meta. Porém, quando nos tornamos adultos, talvez essa se torne uma tarefa mais grata. São tantos os afazeres, tantos os planos para o futuro próximo -- e para aquele que praticamente cai na esfera dos nossos sonhos -- que se torna mais fácil nos tornarmos autômatos. Acordar, tomar um suco. Ligar o computador. Trabalhar. Responder e-mails. Olhar o Facebook. Almoçar. Ir ao banco. Comprar roupas. Tomar um café. Responder mais e-mails. Escrever um texto. Tomar banho. Assistir a um filme. Dormir. O meu pequeno e insignificante circuito fechado que tem me salvo a vida. E posso até mesmo dizer que, ao contrário do que sempre acreditei, consegui encontrar felicidade na disciplina, dois termos que até bem pouco tempo eram antônimos no meu vocabulário. Será essa a vida adulta? Provavelmente não. Espero que não. Entretanto, enquanto eu não aprender qual é o meu ponto de equilíbrio nessa vida, ou algo que seja próximo a isso, assim terá de ser.
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quinta-feira, 19 de janeiro de 2012
My boy could build coffins

Não sou fã de música indie e apesar de nem achar Florence and the Machine lá essas coisas, chego até a simpatizar um pouquinho. Nunca tinha parado para ouvir nada deles até que uma amiga me enviou esse link, dizendo que ao ouvir a música só conseguia lembrar de mim:
http://www.youtube.com/watch?v=ZMTheB3pGSc
My Boy Builds Coffins
Florence + The Machine
My boy builds coffins with hammers and nails
He doesn't build ships, he has no use for sails
He doesn't make tables, dresses or chairs
He can't carve a whistle cause he just doesn't care
My boy builds coffins for the rich and the poor
Kings and queens have all knocked on his door
Beggars and liars, gypsies and thieves
They all come to him, 'cause he's so eager to please
My boy builds coffins, he makes them all day
But it's not just for work and it isn't for play
He's made one for himself
One for me too
One of these days he'll make one for you
My boy builds coffins for better or worse
Some say it's a blessing, some say it's a curse
He fits them together in sunshine or rain
Each one is unique, no two are the same
My boy builds coffins and I think it's a shame
That when each one's been made, he can't see it again
He crafts everyone with love and with care
Then it's thrown in the ground, it just isn't fair
My boy builds coffins, he makes them all day
But it's not just for work and it isn't for play
He's made one for himself
One for me too
One of these days he'll make one for you
Ok, morbidez, aqui me tens de regresso, se é que algum dia cheguei a ir embora...
quarta-feira, 18 de janeiro de 2012
A felicidade é uma quimera

Eu me lembro com requintes de crueldade da noite que dei início a esse blog. Eu estava perdida. Em uma cidade que eu não conhecia e não entendia. Vivendo uma vida que, exceto por alguns detalhes que foram o que de fato em manteve erguida naqueles tempos, eu achava que não era a minha. E não era mesmo. Eu comecei a escrever esse blog por puro desespero. Não tinha ninguém para conversar além das paredes de um quarto de hotel e por isso resolvi publicar uma página anônima para quem também estivesse à deriva.
Com o tempo, o desespero resolveu voltar para as sombras, onde ele fica calado, apenas à espreita, e eu retomei minha vida. Voltei a encontrar minha alma em alguma esquina ensolarada desse balneário infernal que me acostumei a chamar de casa, voltei a trabalhar com o que acredito e voltei a tentar escrever algo "de verdade". Porém ao revisitar esses poucos posts, vi que o que poderia haver de verdadeiro já fora escrito. O blog perdido, assim como eu, foi finalmente encontrado.
E, assim, resolvi voltar a jogar meus pensamentos sobre esse fundo escuro. Talvez porque eu esteja pensando em voltar para a terapia. Ou quem sabe para recuperar um tom de escrita que me agrada. Ou, quem sabe, para tentar recuperar um pouco da razão, essa realidade mórbida que algum dia se faz tão necessária para nossa sanidade, em meio ao feriado que minha vida se tornou nos últimos anos.
Podem pensar que só alguém insano reclamaria da felicidade. Não creio que eu esteja de fato desdenhando do fato de experimentar uma existência feliz. Muito pelo contrário. Meu desejo é envolver em meus braços esse sentimento que às vezes se faz tão misterioso e apertá-lo com todas as minhas forças para que não fuja. Fundí-lo sob a minha pele, em minha carne, até as entranhas, para que nunca mais possa sair de mim. Porém já estou muito grandinha para saber que o "felizes para sempre" sempre acabará sob uma sepultura e que geralmente os contos de fadas se tornam pesadelos muito antes disso.
É por isso que a felicidade me assusta. Mais que a dor, mais que a melancolia, mais que o próprio medo. A felicidade é um sentimento efêmero e que depende de um tênue equíbilibrio para se fazer presente. Quando penso em todos os elementos da minha vida responsáveis por esse meu atual estado de espírito, minha vontade é devolvê-lo aos remetentes, pois se um deles deixar de ser, cai o meu castelo de cartas e mais uma vez me quedarei sozinha, sem saber para onde ir, tendo só a melancolia como par.
Talvez o melhor seja seguir os manuais da conduta padrão e não pensar no assunto. Viver o momento, quem sabe. Não ser tão teimosa, ou bestimuça, como diria a minha avó. Serve de alento saber que, quando a felicidade falhar, meus companheiros de sempre estarão me esperando, de braços abertos e, talvez, eu me sinta mais confortável na companhia de meus parceiros de longa data.
Com o tempo, o desespero resolveu voltar para as sombras, onde ele fica calado, apenas à espreita, e eu retomei minha vida. Voltei a encontrar minha alma em alguma esquina ensolarada desse balneário infernal que me acostumei a chamar de casa, voltei a trabalhar com o que acredito e voltei a tentar escrever algo "de verdade". Porém ao revisitar esses poucos posts, vi que o que poderia haver de verdadeiro já fora escrito. O blog perdido, assim como eu, foi finalmente encontrado.
E, assim, resolvi voltar a jogar meus pensamentos sobre esse fundo escuro. Talvez porque eu esteja pensando em voltar para a terapia. Ou quem sabe para recuperar um tom de escrita que me agrada. Ou, quem sabe, para tentar recuperar um pouco da razão, essa realidade mórbida que algum dia se faz tão necessária para nossa sanidade, em meio ao feriado que minha vida se tornou nos últimos anos.
Podem pensar que só alguém insano reclamaria da felicidade. Não creio que eu esteja de fato desdenhando do fato de experimentar uma existência feliz. Muito pelo contrário. Meu desejo é envolver em meus braços esse sentimento que às vezes se faz tão misterioso e apertá-lo com todas as minhas forças para que não fuja. Fundí-lo sob a minha pele, em minha carne, até as entranhas, para que nunca mais possa sair de mim. Porém já estou muito grandinha para saber que o "felizes para sempre" sempre acabará sob uma sepultura e que geralmente os contos de fadas se tornam pesadelos muito antes disso.
É por isso que a felicidade me assusta. Mais que a dor, mais que a melancolia, mais que o próprio medo. A felicidade é um sentimento efêmero e que depende de um tênue equíbilibrio para se fazer presente. Quando penso em todos os elementos da minha vida responsáveis por esse meu atual estado de espírito, minha vontade é devolvê-lo aos remetentes, pois se um deles deixar de ser, cai o meu castelo de cartas e mais uma vez me quedarei sozinha, sem saber para onde ir, tendo só a melancolia como par.
Talvez o melhor seja seguir os manuais da conduta padrão e não pensar no assunto. Viver o momento, quem sabe. Não ser tão teimosa, ou bestimuça, como diria a minha avó. Serve de alento saber que, quando a felicidade falhar, meus companheiros de sempre estarão me esperando, de braços abertos e, talvez, eu me sinta mais confortável na companhia de meus parceiros de longa data.
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